Pele-a-pele com o papá ~Progenitor/a não gestante

O Ser Humano é um bicho “engraçado”. Precisa de estudos para provar o que sabemos e observamos de forma instintiva na Natureza. Estudos que demonstrem que não retirar um recém-nascido aos pais é benéfico….ou melhor: precisa de estudos que provem que não separar um bebé de sua mãe ou pai não é prejudicial. Pois bem. Já existem muitos estudos que provem isso.

Fala-se muito do pele-a-pele com a mãe/pessoa que pariu, mas é raro o foco estar no pai / progenitor/a não gestante.

É preciso que reconheçamos com reverência o processo enorme pelo qual um bebé recém nascido passa, em poucos minutos, imediatamente depois de nascer. Passa de um ambiente aquático para um ambiente terrestre. Sente frio e fome pela primeira vez. Os sons abafados pelas paredes escuras do útero e o líquido amniótico, são agora mais estridentes. A luz é mais forte do que os seus olhos estão habituados. Mesmo nas melhores das circumstâncias, partindo do princípio que um bebé não vá passar por intervenções invasivas, ou separação da mãe e do pai, é muito, para um Ser acabadinho de chegar, integrar.

Enter o pele-a-pele. Esta técnica, inicialmente apelidade de kangaroo care e testada em bebés prematuros, traz inúmeras vantagens físicas e emocionais aos recém nascidos de termo também. E felizmente já vai sendo prática na maioria dos hospitais portugueses, com várias gradações de tempo e respeito é certo, mas vai. O pele com pele regula o ritmo cardíaco e respiratório do bebé, para uma melhor adaptação à vida extra uterina, estimula a digestão e o interesse pela amamentação, regula a temperatura do bebé, promove a sua colonização de “bactérias boas” da mãe, estimula o libertar das hormonas promotoras da amamentação.

Em bebés prematuros, o pele a pele pode significar uma hospitalização mais curta, melhor níveis de oxigenação, uma redução dos níveis de cortisol, e mais crescimento.

Geralmente quando pensamos em pele a pele pensamos numa mãe e bebé coladinhos um ao outro, na chamada hora de ouro. Mas, e o pai / outra mãe? Apesar de escassa, a literatura já se começa a debruçar sobre a importância e benefícios do pele-a-pele com o/a outro/a progenitor/a, tanto em casos de impossibilidade da mãe o poder fazer, como depois dessa hora de ouro.

O QUE DIZ A EVIDÊNCIA?

Uma revisão sistemática e meta-análise de estudos randomizados recente (2022) com o objetivo de determinar os resultados do cuidado pele a pele paterno tanto nos pais como nos bebés, concluiu entre outras coisas que o tempo de choro foi menor nos bebés que tiveram pele-a-pele com o pai, em comparação com os bebés que ficaram numa encubadora ou berço.

Este estudo “Efeitos do contato pele a pele entre o pai-recem nascido no apego: um ensaio controlado randomizado”confirmou os efeitos positivos das intervenções do pele-a-pele no comportamento de cuidado infantil dos pais em termos de explorar, falar, tocar e cuidar e na melhoria da relação de apego pai-recém-nascido 3 dias após o parto. Embora o facilitar do pele-a-pele mãe-filho e a amamentação imediatamente após o parto seja uma prática obstétrica padrão em Taiwan, poucos pais beneficiam atualmente de pele-e-pele com seu recém-nascido durante a hospitalização pós-parto.

Já neste “Contato pele a pele com os pais e o impacto nos resultados infantis e paternos: uma revisão integrativa” de 2016, se concluiu que “O contato pele a pele pai-bebé teve impactos positivos nos resultados dos bebés, incluindo temperatura e dor, marcadores biofisiológicos, resposta comportamental, bem como bons resultados paternos, que incluem a realização do papel parental, comportamento de interação paterna e menos stress paterno e ansiedade. “O envolvimento do pai no contato pele a pele parece ser viável e benéfico tanto para os bebés quanto para os pais.”

E aqui concluiu-se que https://ebn.bmj.com/content/20/4/112   “O contato pele a pele pai-bebé parece ser benéfico, mas as experiências paternas relativamente a isto precisam ser exploradas.”

E em relação a bebés nascidos por cesariana, este estudo de 2021,  concluiu que os recém-nascidos que tiveram contato pele a pele com os pais após cesarianas apresentaram padrões fisiológicos mais estáveis.

JUST DO IT

Numa era em que tanto falamos de igualdade de género e igual participação de pais e mães no cuidado dos filhos, temos também de pensar, para além de políticas públicas que promovam essa participação, que a presença do pai ou outra mãe na vida daquela criança começa desde cedo.

Na minha jornada como doula, depois de acompanhar um casal no descobrir da informação, escolha e passagem pela intensidade que é um processo de parto, há uma coisa que me deixa invariávelmente de lagrimita boa ao canto do olho: o pele-a-pele com o papá ou outra mamã. E aquele bebé a revirar os olhos e ficar atento, ao ouvir aquela voz familiar. O cheiro da cabecinha do bebé, idealmente sem gorrinho, é um shot de oxitocina. Faz bem a todos, este momento.

A RESSALVA DO COSTUME:

Nem todos os partos são lindos, maravilhosos e de baixo risco. Nem todos os hospitais são respeitadores e amorosos. Nem todos os quadros clínicos permitem este contacto imediato. Há histórias difíceis que traumatizam a família. Acredito que as coisas podem ser reparáveis. Recuperáveis. E que enquanto uma família apanha os cacos do que foi uma experiência de parto difícil, seja por más práticas, seja pelas circunstâncias clínicas, o pele-a-pele é sim uma forma reconfortante e suportada pela evidência de (re) encontrarem o caminho uns para os outros.

Um agradecimento a estes pais e maês não gestantes que autorizaram a partilha destas suas fotos, em momentos tão únicos e íntimos.

Obrigada. Aprendi com todas e todos.

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